A palestra proferida por Lucas Nascimento, professor de Linguística na UEFS, “Quando atos polêmicos desafiam os limites da ética discursiva: o discurso religioso no espaço público digital”, mostrou uma visão interessante acerca dos atos polêmicos e as discussões geradas por meio desses atos em ambiente digital. O palestrante iniciou o evento apresentando os objetivos de sua pesquisa, que seria:
1- Argumentar sobre a pertinência de estudar a polêmica sob uma perspectiva ética, colocando em questão o discurso religioso de evangélico no espaço público digital.
2- Expor alguns breves resultados de análise de um evento polêmico digital em torno de uma peça publicitária da Burger King a fim de compreender como é possível se colocar a interrogação de uma ética discursiva em campos em disputa no espaço público digital.
O autor iniciou a discussão acerca do primeiro objetivo utilizando como exemplo um acontecimento polêmico envolvendo uma pastora, já que em uma transmissão ao vivo de um culto, ela reclamou dos fiéis levantando bandeiras identitárias. Muitos afirmaram ser um ataque racista e homofóbico. O vídeo viralizou e muitos evangélicos, inclusive, criticaram. A pastora postou uma nota retratando-se, e não foi criminalizada já que seus pronunciamentos foram entendidos como exercício da crença religiosa.
Esse exemplo utilizado pelo professor relacionou muito bem com a questão discutida, já que a fala provocou reações de condenação moral em todas as esferas, visto que defensores de movimentos identitários se sentiram ofendidos, evangélicos com pensamentos mais liberais condenaram por não se sentirem representados e os evangélicos mais tradicionais a condenaram por “abaixar a cabeça” e se retratar.
O palestrante lança a pergunta: “Em que medida a polêmica é condição de possibilidade para discursos desajustados aos valores dos espaços públicos em que esses discursos circulam?” Logo após, ele nos mostra que esses atos polêmicos desencadearam um acontecimento discursivo moral. Isso porque causou um conjunto de comentários e reações em dado grupo da sociedade decorrente de um enunciado. Assim, ele utiliza dos pensamentos de Marie-Anne Paveau acerca da linguagem e acontecimento discursivo moral, apresentando a definição de virtude discursiva.
Após, o professor Lucas Nascimento apresenta o fato de o culto ser presencial e não sabermos a reação das pessoas que escutaram no momento, sabemos apenas a reação que provocou no ambiente digital, após ser transmitido na internet. Então ele nos lança uma pergunta para meditar, sem fornecer a resposta: “Seria o enunciador digital híbrido?” Confesso que não tinha parado para pensar nesse ponto, o que me deixou pensativa, creio que o discurso, ao ser propagado no meio digital, provoque mais reações adversas, mas não havia parado para pensar na possível posição híbrida do enunciador.
O autor apresenta outro questionamento, ao nos mostrar que certos enunciados extrapolam certos limites, tornando-se objetos de condenação moral, seria então o ato de polemizar, ético? Ele responde que sim e apresenta a fala de Bakhtin, de que uma filosofia da vida só pode ser uma filosofia moral. Sendo assim, o ato de polemizar funda-se em uma atitude de defesa de valores que o indivíduo ama.
Assim, o professor apresenta a construção do objeto de pesquisa, pensando nos limites éticos no ato de polemizar, nas formas violentas de comunicação que aumentam a polarização e na busca por uma sabedoria prática pensando nas virtudes de um discurso.
Para apresentar o segundo objetivo, o professor Lucas Nascimento apresentou o acontecimento envolvendo a ideologia de gênero e o burger king utilizando crianças em suas propagandas. A propaganda tinha a intenção de chamar a atenção dos questionamentos de pessoas adultas acerca de explicar questões envolvendo ideologia de gênero para crianças, o objetivo era mostrar que para as crianças, era algo simples. Porém, o vídeo causou uma reação dos que não concordavam com as pautas, provocando movimentação e hashtags nas redes sociais, buscando o boicote da empresa alimentícia. Até mesmo o pastor Marcos Feliciano se pronunciou e participou do movimento, considerando um excesso utilizar crianças para polemizar. Muitos conservadores se pronunciaram também, criticando a ação do restaurante. Até mesmo uma escola cristã utilizou crianças para responder à propaganda do Burger King. Muitos consideraram discurso de ódio. Interessante pensar nesse evento e meditar acerca da polarização de opiniões, em que ambos utilizaram crianças para propagar seus próprios ideais.
Portanto, o autor finaliza sua apresentação questionando: “Quais limites foram ultrapassados nessa polêmica, o que causa tanta indignação moral?” Assim, ele nos mostra que a polêmica se construiu em torno da disputa pelos valores. Muitos buscam quebrar os valores e a moral religiosa, enquanto outros lutam para preservar. O autor deu sua definição de evento polêmico, que seria a disputa de sentidos de um mesmo objeto. O fato de envolver crianças na questão foi um dos fatores que mais gerou polêmica.
Apesar de ser destinada para o meio acadêmico, visando atingir profissionais que buscam estudar acerca da argumentação e do discurso digital, recomendo a palestra para todas as pessoas, já que a linguagem é acessível para todos os públicos e discute questões importantes para todos que vivem em sociedade e utilizam os meios digitais para comunicação. Entender quais são os limites do ato de polemizar, se essa atitude é ética e o porquê das condenações morais de discursos polêmicos nos mantém situados e nos ajuda a desenvolver senso crítico e olhar para esses eventos com um olhar mais científico.
Resenhista : Carol Soares
SEIXAS, R; NASCIMENTO, L. Quando atos polêmicos desafiam os limites da ética discursiva: o discurso religioso no espaço público digital. Conferência evento Tear, 25/03/2022. Disponível em : <https://www.youtube.com/watch?v=ocnoPdi1OvA&t=4787s>
Um comentário em “ Comentários sobre a Conferência de Lucas Nascimento”